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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Meliponicultura e preservação, um exemplo

por José Luiz S. Vieira - de Cuiabá - MT.

Muito se fala em preservação da fauna e flora brasileira. Apesar dos esforços de muitas pessoas, sempre existiu uma linha contrária no meio do agronegócio que usando de nomes politicamente corretos, como agricultura sustentável, continuam destruindo milhares de hectares de florestas, matas, cerrados e até do bioma da caatinga.


Na linha da boa preservação da Natureza, no município de Diamantino, em Mato Grosso, encontrei um exemplo dessas pessoas idealistas que sem muito alarde fazem a diferença na meliponicultura brasileira. É o agricultor e meliponicultor, também entomologista entusiasta no estudo de lepidópteros com diversos trabalhos científicos já publicados. Trata-se de Eurides Furtado.

Em sua fazenda onde explora pecuária e plantio de abacaxi, possui uma área considerável de cerrado como área de preservação. Nesse espaço é possível encontrar diversos ninhos de abelhas nativas, desde jatai (Tetragonisca angustula), passando pela Partamona helleri (boca de sapo), até a bela boca de vidro (Tetragona dorsalis), ali vivendo sem qualquer interferência humana.

Na visita que fiz a essa pessoa extraordinária, chamou-me a atenção a existência de um ninho de uma abelha nativa que seria a "GUIRA" (Geotrigona mombuca Smith), segundo descrição de Paulo Nogueira Neto em "A criação de abelhas indígenas sem ferrão", 1970, 2a. edição - livro que Eurides tem um exemplar bem preservado.

O enxame dessa abelha existe nesse ninho ao longo de 27 anos. Dá pra tentar imaginar quantas gerações dela já passaram renovando-se ao longo desse tempo?

Vamos a singular estória por ele contada sobre esse ninho subterrâneo, existente dentro de sua casa.

Há 27 anos decidiu erguer a casa onde mora na fazenda e trouxe um cunhado do Paraná para o serviço de pedreiro. Quando já tinha feito todo o alicerce da futura casa e iam passar ao trabalho do aterro, mesmo pedreiro procurou-o dizendo: "-Ali naquele trecho da casa tem uma entrada dessas abelhas que saem do chão".

Eurides, preservacionista nato não pensou duas vezes e respondeu: "-Aguarda um pouco que vou resolver isso". Pegou uma curva de pvc de meia polegada, e no anoitecer, quando tinha certeza de que todas as abelhas campeiras já tinham se recolhido, foi até a boca do enxame, e colocou a curva de pvc, cimentando em cima. Na sequência, usando de um pedaço de mangueira de mesma bitola, acoplou na curva para que sua ponta ficasse fora da casa, alcançando onde seria a calçada lateral, que foi construida depois (Não medi, mas essa mangueira tem uns 2,5m de comprimento). Em seguida, cobriu com cimento a mangueira no espaço onde seria necessário nivelamento e aterro naquele trecho... e pronto, as "GUIRA"(?) foram preservadas e estão vivendo no mesmo enxame subterrâneo ao longo desses 27 anos, desde a época em que a casa foi ali contruida naquilo que seria, como era, o espaço natural de nidificação delas, que foi mantido, sem mudanças efetivas, a não ser a entrada, que ficou... um pouquinho mais longe da anterior.


A foto mostra Eurides apontando a entrada da enxame como está hoje. Sobressai na calçada lateral azulejada, onde fez uma ligeira elevação, pra evitar excesso de água escorrendo ali na época das chuvas.

O zelo de Eurides com as nativas não para ai. Numa área coberta, tida como área de serviço externa, e onde ele mesmo fabrica suas caixas modelos PNN, e os suportes para elas, num carinho e amor extremo por abelhas nativas, mantem ao nivel do chão, dois enxames de jatai que enxamearam ali em vasos cerâmicos como iscas que ele cimentou na época da construção dessa área.

Contou-me que pegou desses vasos de cerâmica para plantas, emendou um no outro, fez o buraco de entrada, ligou num um pedaço de mangeira e no outro um pedaço de bambú, cimentando-os nos locais mostrados nas fotos, sem nenhum enxame dentro.



Depois de tudo pronto, com o piso já colocado a cerâmica, com uma seringa injetou um extrato "mistura de restos de enxame de jatais, tipo própolis, restos de cera, polen, enfim, quase o lixo de um enxame velho, diluidos no alcool".


Palavras dele, "com o tempo não demorou muito e duas enxameações de jatais descobriram essas novas moradias e se instalaram".

Digno de todos os elogios nosso amigo Eurides Furtado, um jovem de 63 anos de idade, que pode ser encontrado na fazenda dele, e eventualmente na lanchonete que mantem juntamente com a esposa dona Ana Lucia, na beira da estrada entre o Posto Gil e Nova Mutum, num local chamado "Lanchonete Abacaxi - Vale da Solidão" - onde podemos matar a sede com delicioso suco de abacaxi da produção de sua fazenda, além de gostosos pasteis. Passando pela região não deixe de ir conhecê-lo.

Um comentário:

  1. Meu amigo Zé Luiz e amigos da AME-Rio,

    Que beleza de postagem e de exemplo de preservação.

    Com iniciativas como essa,temos certeza que as nossas abelhas nativas,conseguirão se manter em nosso meio...

    Parabéns,pelas postagens que estão a cada dia,mais completas e interessantes.

    Abração.
    Paulo Romero.
    Meliponário Braz.

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